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quarta-feira, 14 de setembro de 2016

Desabafo

     Nem sei como começar este texto. Queria fazer uma reflexão mais densa e elaborada, mas não estou com cabeça para isso. Amo muito a educação em geral, mas tenho um carinho muito maior pela ideia de dar educação aos mais pobres. Tal posição pessoal me conduziu desde o início para a escola pública.
     Hoje foi um dia triste por algo tão banal. Precisei correr atrás de folhas de sulfite para poder fazer a impressão de provas por que o colégio não dispunha de papeis para isso. Não é culpa da direção, não é culpa de professores. Em meio a toda disputa que existe hoje por este vácuo deixado nos espaços do poder, em meio a toda essa questão ideológica exacerbada e irracional que verte pelas bocas do senso comum cheia de um ódio incoerente, em que momento as pessoas vão parar para resolver questões simples do cotidiano? 
    Professores precisam de seus salários pagos em dia. De seus planos de carreira respeitados. As escolas precisam de funcionários para executar as tarefas simples. É preciso sulfite, papel higiênico, sabão para limpeza, merenda. Alguém ai já viu a cara de tristeza de uma criança pobre que vai ao intervalo de aula buscar uma merenda e não tem uma caneca de leite quente para saciar a fome e aquela dorzinha de cabeça que a fome provoca?
     Em meio a tudo isso, vai ainda minha observação: E o partido que há anos governa o Estado de São Paulo e que atualmente governa o Paraná, que precarizou a educação pública nestes Estados ainda se acha ilibado e guardião da moral nacional. Comprar uma resma de papel sulfite para imprimir provas não é um problema para mim ou para o pai de algum aluno ligeiramente endinheirado, mas esta função cabe ao Estado. Enfim, desculpe o desabafo. Eu apenas estou triste com esse quadro. Me esforço para a tristeza não virar ódio.

quinta-feira, 30 de junho de 2016

Memória em litígio

     Durante a Segunda Guerra Mundial, a França foi ocupada por um governo totalitário, autoritário, ditatorial, genocida. Em meio aos franceses surgiu um grupo que pegou em armas, executou missões de sabotagem, assassinou militares nazistas, se apropriou de patrimônio de franceses que apoiaram as forças nazistas de ocupação. Lá estes foram chamados de "resistência". A população francesa presta homenagem a estes indivíduos até hoje.

      Aqui no Brasil, aqueles que usaram a violência e se levantaram contra regimes tirânicos, autoritários e ditatoriais são chamados de terroristas. Palavras usadas para caracterizar o passado são escolhas ideológicas. A esquerda construiu uma memória sobre aqueles que tombaram lutando contra a ditadura heroicizando-os, mas como é sabido que heróis são fulcros de aspirações coletivas como alertou Mary Del Priore, estes são sempre construção condizentes com um projeto de poder. Mera invenção. 

     Não tem como negar que, ainda que a história séria e comprometida com a ciência desconstrua a imagem heroica dos atores do passado, é nítido que houve uma hegemonia de uma interpretação a esquerda do passado ditatorial brasileiro. Entendo e defendo que isso ocorreu menos por questões ideológicas e mais por questões metodológicas: A direita no Brasil não consegue pensar muito fora do positivismo e do darwinismo social. Nem liberal ela consegue ser. Quando surge políticos e apoiadores que chamam os que tombaram lutando contra a ditadura de terroristas está muito claro que a narrativa sobre o passado está em disputa. Mas isso também revela uma triste e cruel realidade que para mim sempre esteve muito clara: nossa ruptura com o autoritarismo militar foi incompleta, propositadamente mal feita. Até por que os protagonistas deste processo foram os mesmos que iniciaram o regime autoritário.
     

Mariguella - Herói para a esquerda, terrorista para a direita. Se as duas impressões sobre o personagem são construídas por princípios ideológicos, faz sentido atribuir a alguma delas a noção de "verdadeira"?

         O curioso da história é que a memória está sempre em disputa entre os grupos que querem poder, sobretudo quando as instituições se fragilizam. Em geral, aqueles que tendem a adjetivar e generalizar sem senso crítico, buscando uma única fonte para referendar sua visão distorcida da realidade se impõem na gargalhada tosca e inculta daqueles que nada levam a sério ou na agressividade boçal e verbalizada na voz daquele que é incapaz de conviver e compreender o outro.