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quarta-feira, 16 de abril de 2014

Em estado de greve.


                Não desejo nestas linhas fazer a defesa ou não da greve que está prestes a estourar dia 23 de abril. Confesso que estou preocupado mais do que entusiasmado. Estarei aqui sendo um cronista, revisitando algumas memórias, muitas distorcidas pelo tempo. Tenho plena consciência dos limites deste resgate.
                Lembro bem quando ainda aluno, em 1988, houve uma greve. Eu estudava na Escola Estadual Alfredo Chaves. Naquela época, esta escola oferecia ensino de primeira até a quarta série do então chamado primeiro grau. Aquela greve ficou famosa no Paraná. Foi no governo do hoje senador Álvaro Dias, aquele mesmo que autorizou a cavalaria da Polícia Militar a cavalgar sobre os professores.
                Na ocasião minha mãe reclamava, afirmando coisas como "estes vagabundos destes professores que não querem trabalhar". Pobre coitada da minha mãe. O filho se tornou professor, o filho se tornou vagabundo.
                Não me recordo de como foi feita a reposição ou se houve ganhos para a categoria. Não fui também às fontes históricas para trazer a informação. O que sei é que os eventos daquele mês de agosto de 1988 tornaram-se fulcro para as lutas posteriores dos educadores que almejaram e almejam melhorias para a educação.
                Os anos 1990 foram os piores anos da educação no Estado do Paraná. A péssima gestão da SEED durante o mandato do governador Jaime Lerner (1995-2002) promoveu uma verdadeira quebra na educação. A média dos alunos foi reduzida para 50. A educação foi terceirizada. O Estado contratou os serviços de uma empresa de recursos humanos criada para suprir as necessidades de mão de obra do Estado. Esta empresa contratava pessoas sem a formação adequada para o exercício da docência. Foram oito anos de retrocesso. Para o leitor ter uma ideia, minha professora de química da segunda e terceira séria do então segundo grau era uma fisioterapeuta. No primeiro ano, o professor de química era agrônomo. Meu professor de física era engenheiro civil. Meu professor de matemática era administrador e sargento da aeronáutica. Nestes anos todos na educação, eu ainda escuto relato de acadêmicos de direito que lecionavam filosofia e história, acadêmicos de jornalismo lecionando inglês e português, entre outras bizarrices daquela que, para mim, foi a pior gestão da educação paranaense.
                Todo este colapso na política educacional veio à tona com a greve de 2000. A última greve realizada pelos professores das escolas públicas do Estado. Era um monte de crise econômica global e o modelo político adotado em praticamente todo o país nesta década estava sendo questionado. Os eleitores demandavam um Estado mais presente.
                Em 2000 eu era acadêmico do curso de história. Já havia decidido que meu foco seria a carreira docente, em escola pública. Eu percebia a crise, notava o colapso. Mas na época já era vivo em mim uma característica que só foi ficando mais forte com o tempo: a crença de que a educação é capaz de melhorar os indivíduos, materialmente, emocionalmente e, sobretudo, moralmente. Eu almejava fazer algo de positivo na vida de jovens e crianças, mesmo por que, em meio a toda aquela maluquice que eu vivi nos anos 1990, tive uns poucos bons professores que fizeram a diferença na minha vida. Muitas vezes minha decisão de ser educador e não pesquisador era alvo de chacota e às vezes até de represália por parte de alguns colegas. Mas só quem sabe o prazer que é ver os jovens fazendo bom uso de seus livres-arbítrios em função de nossas orientações entende perfeitamente o que estou falando, entende a razão pela qual me engajo.
                O governo de Roberto Requião (2003-2010) fez uma verdadeira revolução na educação. Sancionou a lei do Plano de Carreiras, deu aumento acima de perdas inflacionárias para os professores, implantou 20% de hora atividade mesmo antes de a lei nacional determinar a obrigatoriedade destas horas. Modernizou escolas, possibilitou a aquisição de equipamentos, promoveu a capacitação dos docentes, informatizou escolas e valorizou a carreira. Foi neste contexto que entrei na docência. Nunca vivi como professor a destruição dos anos 1980 e 1990. Vivi um momento bom e sei o quanto isso foi importante.
                Não vou entrar no mérito de comentar o governo atual. Prefiro me ater ao problema moral e pessoal que eu, como educador estou enfrentando diariamente quando penso sobre a greve futura.
                Tenho diversos receios. Temo que a greve não promova as melhorias necessárias, temo não receber meus vencimentos e me endividar; temo que a greve afete a formação dos jovens, adolescentes e crianças, estes que são o objeto da minha ação e engajamento.
                Decidi aderir ao movimento, mesmo sendo completamente desconfiado dos possíveis resultados. Decidi também ir à escola em todos os dias da greve e, se houver alunos, conversar com eles sobre os aspectos da legislação educacional, do funcionamento das instituições políticas, dos desafios da vida adulta, da minha opinião sobre a greve. Não acho correto que a greve promova o afastamento do professor em relação à sociedade. Mas ainda não sei se estas minhas ações poderão ser executadas. Estou ansioso, perdido, com medo. Prefiro imensamente que o governo negocie com o sindicato, com o movimento e apresente uma proposta, mesmo que gradativa, de implantação daquilo que está sendo reivindicado.
                As questões estão sendo postas, as escolas estão em ambiente de tensão. Todos nós estamos preocupados, mas estamos querendo melhorar a educação. Peço aos leitores que procurem conhecer mais sobre a pauta do movimento. Não é aumento de salário. Peço que leiam com atenção o material do link abaixo.
                Não consigo concluir o texto, tamanha é minha tensão, mas espero poder ter aproveitado bem o tempo que me foi dado para pensar sobre o tema. Desde já, obrigado.

André Carlos

sexta-feira, 4 de abril de 2014